Orgasmo e Depressão
É fato que existem algumas (várias) intersecções entre orgasmo, libido e depressão.
Como a gente já disse um milhão de vezes, nosso cérebro é nosso principal órgão sexual, e por conta disso as alterações decorrentes da depressão ou dos antidepressivos podem ter um impacto no nosso orgasmo e também no nosso desejo. Vamos lá.
LIBIDO E DEPRESSÃO
É comum que a libido seja diretamente afetada pela depressão, o que pode fazer a pessoa enfrentar algumas barreiras na vida sexual. Isso acaba rolando porque a depressão causa modificações químicas no cérebro, principalmente nos neurotransmissores responsáveis pela regulação de humor, foco, atenção e prazer, como a serotonina e a dopamina, hormônios que também atuam na nossa fisiologia sexual. A baixa auto estima, sentimento comum enfrentado na depressão, é resultado da percepção negativa e alterada que temos da nossa própria imagem e valor. Esse sentimento influencia na libido, que por sua vez influencia na masturbação e nos orgasmos. É um efeito cascata retroalimentado, que pode ser muito difícil de sair. Um dos sintomas mais conhecidos da depressão é a anedonia, caracterizada pela incapacidade de sentir prazer em atividades que eram tidas como prazerosas. Claro que o que é prazeroso vai variar de pessoa pra pessoa, mas geralmente o sexo tá entre elas.
DISFORIA PÓS-SEXO
"Tenho ataques de choro e crises depressivas após a relação sexual". Esse foi o relato de um homem entrevistado por uma pesquisa da Universidade de Tecnologia de Queensland, na Austrália, que busca entender o que está por trás da sensação de depressão após o orgasmo. Como o próprio nome sugere, a disforia é uma sensação oposta à euforia, normalmente o sentimento associado ao orgasmo. Às vezes, além da vontade de chorar, a pessoa pode ficar irritada e jogar toda sua frustração em cima da sua parceria. Os motivos por trás disso ainda não são muito claros: a disforia pode estar relacionada a um processo hormonal na amígdala neural, estrutura do cérebro responsável por regular nossos sentimentos e emoções, uma vez que durante a relação sexual, a amígdala pode reduzir sua atividade. Ou, pode ser ainda produto de uma educação sexual muito opressiva, em que o sexo e a masturbação são tabus e geram angústia para a pessoa. Ou ainda, um subproduto genético. Bom, mesmo que a ciência não tenha desvendado o real motivo dessa sensação, ela dá embasamento para entendermos que a sensação de tristeza é comum, normal e não significa o fim da sua vida sexual. E fica a dica: se a disforia persistir a um ponto de atrapalhar sua vida e seu prazer, convém buscar um médico ou terapeuta para encontrar maneiras de lidar com ela :)
ANTIDEPRESSIVO
O Brasil é o país que mais tem ansiosos, com maior número de casos de depressão na América Latina e o terceiro país que mais usa redes sociais no mundo. E a conta fica ainda mais alta quando se é mulher, visto que somos 2 vezes mais propensas a enfrentar quadros depressivos e ansiedade. Entre a lista de efeitos colaterais estão a redução do desejo, a dificuldade de atingir o orgasmo e de se excitar. Vale avisar que os efeitos variam conforme a formulação do antidepressivo, dose e tempo de uso. E como se não bastasse, existe uma variação de como cada um deles age em cada pessoa. Os que mais ferram a sexualidade, conforme um estudo conduzido pela Clínica Mayo (EUA) são as drogas que atuam sobre a serotonina (como fluoxetina, paroxetina, sertralina, citalopram, escitalopram e venlafaxina, entre outras). Acredite ou não, algumas mulheres relatam perder totalmente a sensibilidade nos genitais. Pudera: histórico de abuso, variação hormonal e cultura machista são o combo pra aniquilar com a nossa libido. Quem tem pênis ainda consegue dar um salve com viagra e similares, já quem tem vulva, fica à mercê. Mas, nem tudo está perdido. Existem antidepressivos com mecanismos diferentes de ação, e alguns deles têm menos efeitos sobre o sexo (como bupropiona, mirtazapina e trazodone, este último mais usado contra insônia). Em alguns casos, quando a medicação não pode ser substituída, pode-se pensar em reduzir um pouco a dose e associar outra substância. Psicoterapia e uma boa relação com o psiquiatra são básicos pra não cair nesse buraco, e nesse sentido, falar sobre sexo, masturbação e prazer são essenciais para manter uma vida sexual ativa e gostosa.
ORGASMO TERAPÊUTICO
Sim, amor: gozar pode ter um efeito terapêutico. Quem diz isso não é só a Climaxxx, mas sim o psicólogo americano Barry Komisaruk, professor da Universidade Rutgers, de Nova Jersey, há 30 anos investigando os benefícios do prazer sexual no bem-estar das mulheres. Gozar pode ajudar no tratamento de pacientes com ansiedade, depressão ou dependência. Quando se tem um orgasmo há um aumento impressionante do fluxo de sangue e de oxigênio na cabeça, ambos nutrientes muito benéficos para o cérebro. Nele, há uma zona chamada núcleo accumbens que é a área do prazer. Essa área é ativada pela nicotina, pelo chocolate, pela cocaína e também pelos orgasmos. Vale dizer também, que após o orgasmo, o corpo libera oxitocina (hormônio que reduz o estresse) e endorfina (que gera sensação de bem-estar e prazer). Claro, os efeitos hormonais do orgasmo são temporários, mas ao que as novas pesquisas indicam, receitar orgasmos como um tratamento complementar tá super on.
DISFUNÇÃO ERÉTIL
A relação entre depressão e disfunção erétil é bidirecional: se, por um lado, a depressão aumenta significativamente o risco de disfunção sexual, a disfunção também aumenta o risco (ou agravamento) de quadros depressivos. Um estudo feito 2018 descobriu que 62,5% dos participantes do sexo masculino com depressão experimentam, também, alguma disfunção sexual. São 17 pontos percentuais a mais do que a média nacional somente com disfunção sexual, que é 45% segundo o ESVB. Os mitos sobre a masturbação também foram mais prevalentes entre os que apresentavam sintomas depressivos, segundo o trabalho.
ANORGASMIA
Anorgasmia e depressão podem andar de mãos dadas. Mulheres com depressão têm de duas a quatro vezes mais probabilidade do que mulheres não deprimidas de relatar problemas para atingir o orgasmo. Já quem sofre de uma ansiedade clínica apresenta um risco duplo de problemas com orgasmo. Os fatores que inibem o gozo incluem preocupação ou pensamentos negativos sobre a própria função sexual e a tendência de ser facilmente distraído na excitação sexual. Embora faltem pesquisas, há relatos de que a depressão faz com que quem tem vulva demore muito mais pra ter um orgasmo, fazendo do sexo e masturbação uma corrida interminável.
CONCLUSÃO
Assim como a falta de libido, as causas da depressão são multifatoriais e estão intimamente relacionadas com o momento que estamos passando, onde estamos inseridas, qual o suporte que temos (interno e externo), além do contexto social. É duro pensar que vivemos em uma realidade de opressão e abuso, que ajuda a nos adoecer, e que depois nos coloca no lugar de doentes. É pesado ter que lidar com a realidade de que, apesar de não termos infligido sofrimento a nós mesmas, tenhamos que buscar a cura ou tratamento sozinhas, ou acompanhadas das nossas. Onde há uma ferida na psique das mulheres, existe uma ferida correspondente na cultura e na sociedade. O que a gente espera por aqui é que tenhamos cada vez mais domínio sobre nossas escolhas e corpos, para que a gente possa trabalhar na cura daquilo que realmente é nosso, e não daquilo que nos foi herdado por uma cultura que nos oprime e aniquila.
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FONTES:
https://www.scielo.br/j/jbpsiq/a/6wjXVgvSwzMx6bgpRJdtbQM/?lang=pt
https://www.bbc.com/portuguese/geral-45056096.amp
https://doutorjairo.uol.com.br/leia/masturbacao-e-depressao-existe-uma-ligacao-entre-elas/amp/
https://www.willianrezende.com.br/efeitos-da-depressao-na-vida-sexual/
© Texto de Larissa Ely. Lari é designer, fundadora & sócia da Climaxxx.
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